segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Geração Erasmus


Estão, como se diz no neologismo próprio da sua geração, "em Erasmus." Cruzam os céus da Europa em voos tão low-cost que o preço do bilhete não dava nem para uma viagem de "Alfa"; povoam - que desaforo! - as baixas e centros históricos das cidades da Europa, aproveitando e contrariando a desvalorização eminente do património específico do nosso "velho" Continente. Têm a sua "casa de férias" nas redes sociais; desafiam as suas e as nossas noções de dimensão e geografia e, nesse movimento perpétuo (que, como na Odisseia de Homero, terá o prometido grand finale sentimental no inevitável "regresso a casa"), vão alargando as vistas ao Continente, celebrando-o, se não nas certezas, pelo menos, na consciência lúcida das dúvidas.

Com espírito olímpico, pulam fronteira após fronteira, física e ideológica. Misturam-se, que foi para isso que se fizeram à estrada. Não estão, como boa parte da dita "massa crítica", instalados na auto-referenciação da empobrecida arqueologia teórico-partidarizante que, ora mais ideológica, ora mais reaccionária, mas quase sempre estéril, lhes é assombrosamente indiferente - se assim fosse, não teriam partido. Estão aí para abraçarem as suas escolhas (mesmo as erradas), para celebrar as diferenças entre as Línguas e as Cidades, e enterrar de forma desprendidamente científica os mitos da "impossível coabitação". São viajantes, não são turistas, e este desassossego é intangível na sua face mais brilhante: a valorização, para lá do mercado, da pluralidade dos territórios partilhados - identidade, economia, sociedade - que são porventura a mais cobiçada matéria-prima da Europa e, ao mesmo tempo, a sua principal força de eventual transformação. Estes migrantes saíram de casa para ver menos do mesmo e mais do que não é costume, e ainda estão quase todos na idade do namoro - superam a distância com um sentido de aventura que é, ou devia ser, a base de toda a Aprendizagem. Morreu a "geração interrail", viva a "geração Erasmus". 

O relatório de Junho passado da União Europeia assinalava um total próximo dos 200 mil estudantes que tinham aderido ao programa no ano lectivo de 2008/2009, perfazendo assim um número estimado em dois milhões de jovens europeus que dele beneficiaram desde a sua fundação em 1987, em qualquer um dos 31 países ao abrigo deste "protocolo", que já ultrapassa a Europa dos 27. O projecto alargou-se, entretanto, a estágios profissionais e programas de estudo e formação complementares - no que toca aos estágios, o número de futuros profissionais que deles usufruiu aumentou 50%. 

A projecção de custos do projecto para o quadriénio 2009/2013 está nos 950 milhões de euros, isto é, 237,5 milhões de euros por ano. Tal valor corresponde a metade do preço de um submarino de guerra alemão como os que o Estado Português adquiriu em 2004, e cerca de 10 vezes menos do que o valor de venda de seis fragatas francesas, pago pelos contribuintes da Grécia, entretanto (ou portanto?) "falida". 

Actualmente estima-se que 4% dos estudantes europeus tenham feito parte do programa Erasmus. É pouco, que estamos todos a pagar demasiados impostos. Triplique-se, em nome do equilíbrio financeiro. 

Fontes: Agência Reuters, "Der Spiegel" (Alemanha), "The Financial Times" (Reino Unido), Jornal "Público" (Portugal) e sítio online da Comissão Europeia.



http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=434133

Sem comentários: